Conversas difíceis: A arte de enfrentar
- Isadora Fajardo
- 26 de fev.
- 3 min de leitura
Atualizado: 8 de abr.
Término de relacionamento, discutir a relação, pedir demissão ou demitir alguém, sinalizar que se ofendeu com uma amiga, ou até mesmo apontar algo que te incomodou no parceiro...
Claro que estamos exaustos! A possibilidade de fugir e de não encarar conversas difíceis é muito mais tentadora.
Mas, decidir não enfrentá-las por conta da angústia que causam não faz com que a angústia desapareça. Não tem como “desver” o inconsciente.
Como psiquiatra, eu te digo que conversas difíceis são difíceis porque envolvem uma combinação de fatores emocionais, psicológicos e até fisiológicos. Nosso cérebro entra em um modo de "luta ou fuga", uma resposta instintiva para lidar com situações ameaçadoras. Isso ativa a liberação de hormônios como o cortisol (hormônio do estresse) e a adrenalina, preparando o corpo para reagir ao que é percebido como um perigo — mesmo que esse "perigo" seja apenas uma conversa.
Além do fisiológico, há o medo da rejeição. A ideia de causar o desconforto no outro frustra a nossa necessidade de validação externa. Nosso ego, que busca ser aceito e admirado, fica fragilizado diante da possibilidade de causar um impacto negativo no outro.
A ansiedade em conversas difíceis surge do desconforto em desconstruir nossa “preciosidade”, do medo de que a outra pessoa não nos veja como alguém “digno ou valioso”, afetando nossa autoconfiança, e tornando a conversa emocionalmente mais desafiadora.
O nervosismo não é apenas sobre o desconforto do outro, mas sobre a ameaça à nossa identidade idealizada.
Outro fator importante é o histórico pessoal. Se já passamos por outras conversas difíceis antes e que não terminaram bem, nosso cérebro automaticamente cria uma associação entre esses momentos, revisita essas memórias e nos prepara para o pior.
Além disso, uma característica da condição humana é se sentir seguro quando tem o controle da situação. Em uma conversa difícil se tem algo que é seguro é a imprevisibilidade. Nunca sabemos exatamente como a outra pessoa vai reagir, e aí vem a sensação de falta de controle acionando novamente áreas do cérebro que nos sinaliza que estamos em “perigo” e o resultado é a ansiedade.
As conversas difíceis sempre envolvem temas que nos tocam emocionalmente — críticas, desentendimentos ou sentimentos profundos. Estamos lidando com assuntos que podem afetar nossa autoestima, nossas relações, nosso bem-estar emocional e comprometer nossos ciclos. Claro que o nervosismo é inevitável. Mas não é porque ele é inerente que nós vamos fugir dessas conversas.
“No final do dia, o que conta não são quantas rupturas você tem, mas sim quão boa você é na restauração”.¹
É sobre aquele velho clichê, “está com medo? Vai com medo mesmo”. Com o tempo e a prática, conseguimos desenvolver mais confiança e resiliência para enfrentar essas conversas com mais tranquilidade.
Agora diquinhas práticas da psiquiatra (sem que você precise se transformar em um super-herói ou dar um monólogo digno do Oscar):
Respire fundo. Apenas para lembrar que você está vivo e que, por mais desafiadora que a conversa seja, ela não vai devorar sua alma. Acredite, já passei por algumas dessas e o mundo não acabou — mesmo que tenha parecido o fim do universo na hora.
Prepare-se. Não estou dizendo para ensaiar o discurso inteiro, mas tenha em mente o que realmente quer dizer. Um ponto de partida ajuda a focar.
Escolha o momento certo. Não tente ter a conversa difícil quando a pessoa acabou de ter um dia péssimo ou está distraída no celular. O ideal é que ambos estejam calmos, prontos para ouvir e entender o que está sendo dito, sem explosões emocionais.
Se estiver inseguro ou com dúvida, calma. Ser vulnerável é um superpoder!
Agora, se tudo falhar e você começar a suar frio, lembre-se que nada vai ser pior que aquele momento em que você evitou a conversa por semanas, meses ou anos e ela ficou ainda mais complicada.
Com o tempo, você perceberá que essas conversas difíceis, antes gigantes, são apenas mais um passo para uma comunicação mais honesta e madura, e uma construção para uma vida mais coerente e feliz.
Agora, olhe novamente para a imagem que ilustra este texto. Duas pessoas seguram algo semelhante, mas em proporções diferentes. Isso é exatamente o que acontece em conversas difíceis: o mesmo assunto pode ter pesos e significados distintos para cada um. O que parece leve para você pode ser um fardo para o outro. Às vezes, o verdadeiro desafio não está no que é dito, mas na disposição de enxergar o que o outro está carregando.
Nota de rodapé:
¹Marcela Ceribelli, Aurora: O Despertar da Mulher Exausta, contra capa.
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